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Caso clínico: Necroses das orelhas

As necreoses das orelhas podem trazer canibalismo, mortalidade e morbilidade aos animais. Neste caso o problema foi causado por um estafilococus

11 Agosto 2008
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Descrição da Exploração



A exploração que nos ocupa este mês encontra-se localizada em França, numa zona de baixa densidade suína e sem nenhuma suinicultura próxima.

Trata-se de uma exploração de ciclo fechado com 200 porcas com maneio em bandas de 3 semanas e desmame aos 28 dias.

As primíparas entram a cada 3 semanas e são alojadas na quarentena. a inseminação artificial é realizada com doses compradas a um centro de inseminação e são oriundas de varrascos Piétrain puros.

Após o desmame e até aos 18 a 21 dias depois (baterias) os leitões encontram-se alojados sobre solo de slat total enquanto que na transição e crescimento e engorda são alojados com cama de serradura.

A ração é fabricada na própria exploração salvo a de primeira idade, que é branca e adquirida no exterior.

Os leitões desmamados são tratados através da água de bebida com flubendazol e colistina.

A exploração encontra-se distribuida da seguinte forma:



Estatuto sanitário

A exploração é indemne para Aujeszky e PRRS.
Vacinações: as porcas vacinam-se contra parvovirus e mal rubro e os leitões contra Mycoplasma.


Aparecimento do Caso



Após a detecção de graves problemas de necrose nas orelhas e canibalismo nos leitões desmamados que afecta mais de 50% dos animais na ponta ou na base das orelhas, o suinicultor entra em contacto com o veterinário.


Primeira Visita à Exploração


Maternidade
  • Fertilidade de 85%.
  • 10,5 leitões desmamados/porca.
  • Elevado índice de mortalidade nos nascidos vivos: 15%, sem patologia particular mas relacionado com um inicio difícil da lactação.
Baterias (até aos 18-21 dias após o desmame)
  • Os leitões são misturados em lotes de 60 animais sem respeitar a paridade das mães.
  • Não se observam diarreias, tosse ou mortalidade elevada (só 1%).
  • Os animais apresentam um bom aspecto.
  • Não há sinais de canibalismo nem presença de necrose nas orelhas.
Transição (até aos 70-77 dias de vida)
  • Os animais são alojados com cama de serradura.
  • Após a formação dos lotes aparecem brigas.
  • Observam-se necroses alguns dias depois da entrada na transição, sendo a problemática mais importante até às 2 a 3 semanas após a sua entrada, ou seja, às 5 semanas após o desmame.
  • As necroses aparecem na ponta ou base das orelhas e são originárias do canibalismo.
  • Os lotes são muito heterogéneos.
  • As lesões devidas a canibalismo são uma via de entrada para diferentes gérmenes que provocam artrites ou abcessos.

  • Alguns leitões apresentam um aspecto deteriorado se bem que não apresentam nem necroses nem sinais de canibalismo.
  • Cerca de 50% dos leitões estão afectados por estes problemas de necrose e canibalismo e 10% morrem ou são sacrificados.
Crescimento/Engorda

  • Animais alojados também sobre cama de serradura.
  • Observa-se canibalismo no inicio da fase de crescimento assim como artrite e algumas paralisias.
  • As lesões provocadas pelo canibalismo acabam por cicatrizar e os porcos retomam um crescimento normal durante a segunda metade da fase, se bem que alguns porcos não tenham orelhas.
  • Observam-se tosses nos porcos no final da fase, o que se considera relacionado com a presença de amoníaco nas salas.



Primeiras Medidas



Após a visita o veterinário aconselha levar a cabo as seguintes medidas:

  • Tratar os animais com amoxicilina.
  • Verificar se a exploração se encontra indemne para o PRRS e controlar a circulação de circovirus.
  • Controlar o sistema de ventilação na transição.
  • Controlar a presença ou não de micotoxinas no alimento.
  • Verificar se a serradura utilizada é proveniente de uma origem diferente da inicial.
  • Reforçar as medidas de higiene e limitar a mistura de leitões.

Recolhem-se amostras de soro dos animais para serologia e de ração para identificar micotoxinas.


Resultados das Análises



As serologias para PRRS são todas negativas nas amostras dos leitões no final da transição de forma que se descarta esta hipótese.

As PCR para circovirus realizadas às amostras de soro de 6 leitões que apresentavam necroses são positivas enquanto que as realizadas a 5 leitões de 40 dias são negativas e 3 das 6 serologias de leitões de 60 dias também deram positivo.

Os resultados das análises para a presença de micotoxinas nos cereais são negativos.

O tratamento com amoxicilina dá resultados médios sobre as necroses.

O controlo da ventilação não evidenciou a presença de anomalias no sistema e por outro lado, o segundo edifício também está afectado. Descarta-se esta via.

Relativamente à serradura utilizada, não tem havido alteração de fornecedor e os porcos de crescimento/engorda, que utilizam a mesma serradura, não apresentam necroses. Abandona-se também esta via de investigação.

Con estes datos na mão, tudo faz pensar na existência de uma circulação de circovirus na transição como origem das necroses. Isto permitiria explicar também a presença de leitões sem lesões mas com redução do crescimento.


Medidas Tomadas



Decide-se vacinar as porcas contra o circovirus e substituir o tratamento com amoxicilina na transição por um tratamento à base de Trimetoprim-sulfa.


Segunda Visita à Exploração



O tratamento com Trimetoprim-sulfa não está a dar melhores resultados que os obtidos com a amoxicilina.

Decide-se enviar, para analizar no laboratório, um leitão vivo com redução de crescimento para confirmar a presença de PMWS. Os resultados do exame histológico são os seguintes:

  • Gânglios: estrutura histológica normal.
  • Íleon: ausência de lesões significativas ao nível da mucosa e das placas de Peyer.
  • Amígdalas: nada a assinalar.
  • Cólon: ligeira dilatação das criptas.
  • Baço: nada a assinalar.
  • Rins: rara presença de pequenos infiltrados inflamatórios.

Conclusão: ausência de lesões tipicas de PMWS.

Aos 90 dias de vida voltamos a recolher amostras de soro dos leitões aos que se tinha recolhido amostras durante a transição para realizar novamente uma serologia para circovirus, obtendo novamente resultados negativos. Os soros de 8 porcos aos 110 dias foram igualmente negativos.

Ao estarem os animais alojados com serradura, não se realizaram análises bacteriológicas às amostras de lesões das orelhas, devido a este contacto com a serradura que tornaria difícil a interpretação dos resultados.

Decide-se injectar os animais com florfeniciol, dando bons resultados.


Evolução do Caso e Diagnóstico Final



Se bem que os lotes procedentes de mães vacinadas contra a circovirose apresentam menos necrose, o problema persiste.

Este novo dado vai na mesma direcção que os anteriores reafirmando que não se trata de uma circovirose já que, neste caso, as serologias tinham sido positivas na engorda e a eficácia da vacina das porcas contra o circovirus tinha sido mais elevada.

Finalmente conclui-se que as necroses são devidas a uma infecção bacteriana, provavelmente devida a Staphylococcus hyicus, agente responsável pela epidermite exudativa.

Decide-se utilizar uma ração de primeira idade com incorporação de florfenicol assim como um refuerço das medidas de higiene, em particular sobre a desinfecção dos pavilhões de transição.

Se estas medidas não funcionam o próximo passo será a utilização de uma autovacina estafilocócica.


Comentários



O aparecimento de problemas de necrose nas orelhas e canibalismo nos leitões desmamados afectando a mais de 50% dos animais numa exploração de ciclo fechado de 200 porcas situada numa zona de baixa densidade suína de França, leva o suinicultor a entrar em contacto com o veterinário. Os problemas aparecem em animais de transição (até aos 50 dias de vida) alojados em cama de serradura e persistem durante a primeira metade da fase de crescimento/engorda.

Se bem que ao principio se suspeite de uma circovirose, finalmente descarta-se esta hipótese.

As necroses aparecidas nas orelhas são fruto de uma infecção bacteriana, provavelmente devida a Staphylococcus hyicus.

As necroses de orelhas são frequentes e tende-se a pensar que o factor desencadeante seja uma infecção viral na transição. Neste caso concreto, a presença de redução de crescimento e os resultados positivos para circovirose das PCR assim como as primeiras serologias realizadas assim o faziam pensar.

Este caso ilustra bem a importância de chegar até ao final das possibilidades e não nos limitarmos a um enfoque parcial.

Por medo de ter demasiada contaminação nas amostras, no inicio não se investigou a possível presença de algum patógeno nas lesões das orelhas. Esta via poder-se-ia ter explorado desde o inicio o que teria permitido seguramente a identificação do patógeno, o antibiograma correspondente e a fabricação de uma autovacina.

Assombra os poucos casos de epidermite exudativa que teve esta exploração enquanto se atribuiu a causa das necroses a Staphylococcus hyicus. A bacteriologia deverá clarificá-lo.

Comentários ao artigo

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