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Caso clínico: Intoxicação por H2S

As intoxicações podem ser um dos factores de morte súbita nas engordas. Foi o que ocorreu nesta exploração com o H2S

1 Setembro 2008
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Aparecimento do Caso



O caso inicia-se numa exploração de engorda de 400 lugares situada em França, quando o suinicultor avisa o veterinário (não o habitual da exploração) após a presença de mortes repentinas numa sala de engorda, com 30 porcos mortos de 50 kg de peso aproximadamente, constatadas por volta do meio-dia. Durante a chamada telefónica o suinicultor comenta ao veterinário que:

  • houve um problema no sistema de distribuição da alimentação, o que levou a que entre 500 kg e uma tonelada de ração tivessem caído na fossa,
  • ambiente muito carregado ao entrar na sala
  • maior parte do resto dos animais da sala com angústia respiratória, levados para outra sala
  • o ventilador não deixou de funcionar

No dia anterior, o veterinário habitual da exploração tinha passado para realizar a profilaxia contra a Aujeszky, sem detectar problema algum. Por outro lado, o técnico que visita regularmente a exploração informa o veterinário encarregado do caso que o suinicultor também tem uma exploração de vacas de leite assim como terras de cultivo.


Hipóteses antes da visita



O veterinário, tendo em conta que não possiu um conhecimento prévio da exploração de engorda, nem da de nascimento, coloca diferentes possíveis causas do problema:

  • Morte por sufoco: esta é a primeira hipótese, se bem que o facto de que o ventilador não tenha deixado de funcionar deixa perplexo o veterinário ante esta possibilidade, é possível que o ventilador tivesse parado de forma momentânea sem que o suinicultor tivesse dado conta? Tendo em vista esta hipótese, a visita terá por objectivo essencialmente comprovar o sistema de ventilação, em particular:
    • altura do efluente sob a slat
    • superfícies de entrada de ar
    • os ajustamentos do ventilador
    • montagem do ventilador (é possível que funcione de forma inversa?)
  • Intoxicação:
    • Por gás, em particular devida a sulfureto de hidrogénio (H2S): a queda da ração na fossa poderia conduzir a uma mistura com o efluente líquido e uma posterior intoxicação, inclusivé com o ventilador a funcionar.
    • Por sal (por privação de água): em principio parece uma hipótese pouco plausível na medida em que os porcos sobreviventes apresentam síntomas respiratórios.
    • Por pesticidas/herbicidas na ração, em particular a possível contaminação do circuito de água por pesticidas ou herbicidas induzida por um efeito "sifão" no momento em que o suinicultor carregava o pulverizador.
    • Por rodenticidas.
    • Por ingestão de ração contaminada: se bem que em principio deveria eliminar-se esta hipótese já que todos os porcos da exploração consomem o mesmo alimento e o problema parece confinado a uma única sala. Alé do mais, não se observou nenhum outro caso parecido em nenhuma das explorações fornecidas pela fábrica de rações que fornece de forma regular esta exploração.
  • Infecções posibles:
    • Actinobacilose
    • Influenza
    • Salmonelose


Visita à Exploração



O pavilhão de engorda divide-se em 4 salas com 4 parques cada uma e 25 porcos por parque. Os solos são de slat total. A ventilação realiza-se por depressão com extracção alta. O esquema da sala 4 é a seguinte:


As 30 mortes na sala de engorda nº 4, situada no final do pavilhão, repartem-se da seguinte forma:

- 17 mortos no primeiro parque, próximo da porta,
- 12 mortos no segundo parque,
- nenhum animal morto no terceiro parque, que se encontra debaixo do ventilador,
- e finalmente 1 animal morto no quarto parque, situado ao fundo da sala.

Os animais vivos da sala afectada mudam-se para outra sala. No momento da visita, aproximadamente 4 horas depois de detectar os acontecimentos, não se observa nenhum sintoma clínico assinalável nos porcos, à excepção de porcos apáticos.

Constata-se que o sistema de distribuição do alimento partiu-se justamente na divisão entre os parques 2 e 3. Contudo, é difícil avaliar a quantidade de ração que caiu na fossa.

Relativamente ao sistema de ventilação, o exame realizado não mostra nenhum tipo de falha visível, observando uma correcta extracção do ar, assim como uma regulação do painel de controlo e umas superfícies de entrada de ar dentro da sala suficientes.

Mede-se a altura efluente-slat, que é de 45 cm.


Exame dos animais



Aspecto exterior dos animais mortos:

  • A posição dos animais mortos (alguns sobre o ventre) e a ausência de lesões cutâneas, (geralmente observadas quando os congéneres se amontoam sobre um porcdo doente) são inusuais e fazem supor uma morte súbita (foto1).
  • Observa-se presença de congestão sanguínea, de forma acentuada na cabeça (foto 2).
  • Marcas do slat claramente visíveis sobre a pele (foto 3).
  • A maioria dos animais apresentam espuma sanguinolenta ao nível do focinho (foto 4).

Foto 1 : posição pouco habitual dos animais mortos
Foto 2: congestão sanguínea, acentuada na cabeça
Foto 3:marcas visíveis da slat
Foto 4: espuma sanguinolenta no focinho

Necropsia:

São necropsiados 3 animais observando:

Cavidade torácica

  • Hidropericardite constatada nos 3 animais
  • Presença de filamentos de fibrina no tórax e abdómen.
Pulmões
  • Edema interlobular nítido nos 3 animais, em particular nos lóbulos apicais e cardíacos.
  • Zonas congestionadas ao nível dos lóbulos diafragmáticos.

Abdómen

  • Acentuada congestão do intestino delgado.
  • Conteúdo intestinal normal
  • Numerosos traços de migração larvária num dos fígados.


Conclusão das necrópsias



As lesões observadas parecem compatíveis com um sufocamento ou uma intoxicação por gases.

Não obstante, a presença de fibrina no tórax e o abdómen num dos porcos necropsiados indica a presença de uma possível infecção bacteriana, se bem que as lesões observadas não parecem compatíveis com uma actinobacilose ou uma salmonelose.

Por precaução o veterinário decide recolher duas amostras de água e de ração e deixar uma amostra ao suinicultor para possíveis temas relacionados com um eventual processo contencioso. Recolhem-se também como amostras dois pulmões que serão conservados em fresco durante a noite.

O veterinário redige um relatório destinado ao perito da seguradora mencionando as lesões observadas durante a autopsia e as hipóteses de diagnóstico de sufocamento à intoxicação por H2S.


Evolução do caso



No dia seguinte o suinicultor informa da morte de outro porco do grupo de apáticos observados no dia anterior, se bem que os demais porcos deste grupo não apresentam sinais clínicos anormais. O veterinário não vê, pois, a necessidade de realizar análises complementares.

O perito da seguradora conclui também como mortes devidas a intoxicação por gás, sendo a queda da ração na fossa e mistura com o efluente a origem. Este perito já tinha visto este tipo de acidentes noutras explorações.


Conclusão do caso



Definitivamente conclui-se que os animais morreram por intoxicação por gás H2S devido à queda de alimento na fossa de efluente.

O sulfureto de hidrogénio H2S é o mais tóxico e provavelmente o responsável pelas mortalidades. Este gás produz-se pela degradação das proteínas por parte das bactérias anaeróbias presentes no efluente. Na ausência de misturas, o gás permanece no efluente.


Comentários



Após o aparecimento de 30 porcos mortos de forma repentina numa sala de engorda, o suinicultor põe-se em contacto com o veterinário

O caso descreve uma intoxicação por sulfureto de hidrogénio (H2S) após a mistura com o efluente, devido à queda de uma quantidade importante de ração na fossa debaixoo do slat.

O Homem é capaz de detectar este gás no ar a baixas concentrações (0,025ppm). Para estas concentrações existe pouco ou nenhum efeito nocivo sobre a saúde humana. Esta detecção permite ao Homem precaver-se da sua presença e procurar um ambiente menos contaminado. Pelo contrério, e de forma assombrosa, a concentrações muito maiores, da ordem das 200 ppm, o sulfureto de hidrogénio leva a uma espécie de paralisia do sistema olfativo de forma que muitas vezes o pessoal das explorações que constatam este tipo de acidentes nos animais podem ser facilmente vítimas desta intoxicação. É necessário, pois, ter sempre em conta o perigo existente e não ficar na sala sem ter tomar antes as medidas necessárias como arejar a sala durante um largo período de tempo e sobretudo, não entrar sozinho na sala.

Neste caso concreto, o suinicultor teve a boa ideia de arejar a sala antes de mudar os animais sobreviventes.

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