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Caso clínico: Abortos

Há muitos factores que podem provocar abortos nas porcas. Neste caso o agente foi a Leptospira

31 Maio 2003
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Descrição da Exploração



A exploração, que se encontra situada no Vale do Pó, região agrícola do norte de Itália, tem 750 porcas produtivas em ciclo fechado com produção de porcos destinados à produção de Presunto de Parma (abate aos 160 kg PV). A genética é Landrace x Large White (mães) e Duroc (varrascos).

Durante 6 meses aumentou-se o número de porcas até alcançar as 900 porcas produtivas. Cerca de 60% das primíparas são produzidas na mesma exploração, enquanto que os restante 40% se compram a um único fornecedor. Estas primíparas entram na exploração com 100 kg PV depois de terem passado um período de quarentena de 50 dias num pavilhão a 7 km da exploração. As primíparas são vacinadas na quarentena contra parvovirose, mal rubro e Aujeszky, enquanto que as porcas adultas se vacinam contra parvovirose, mal rubro (na sala de partos), Aujeszky e rinite atrófica (70 dias de gestação). Cada mês e durante 5 dias todas as porcas se tratam com ampicilina ou oxitetraciclina.

Na exploração só se utiliza inseminação artificial. Até aos 40 dias de gestação as porcas estão alojadas em jaulas, momento no qual passam a alojar-se em parques de 10 a 15 porcas. Alguns parques têm slat (grelha) e outros não, mas todos têm parques externos.



Aparecimento do Caso





Em Agosto de 2002 observam-se abortos com presença de mumificados sobretudo em porcas que se encontram no final da gestação. Todas as porcas independentemente do número de parto parecem afectadas. No momento do aborto a ingesta das porcas é normal e não apresentam febre. Nos meses anteriores de Junho e Julho observou-se um aumento das repetições após a mistura de porcas gestantes. A partir do mês de Agosto há um aumento dos mumificados e nados-mortos.


Agosto
Setembro
Outubro
Novembro
Nados-Mortos
2,5%
4,9%
5,5%
6,0%
Mumificados
3,0%
5,0%
7,4%
7,3%


Primeiras medidas tomadas



Antes de nos chamarem para visitar a exploração, já se haviam realizado diferentes tratamentos sem obter resultados satisfatórios:

  • Todas as porcas foram tratadas com clortetraciclina durante 10 dias.
  • Uma vez se viu que os abortos não diminuiam, todas as porcas foram tratadas com ampicilina durante 7 dias, enquanto que as porcas abortadas alojadas nos parques foram tratadas de forma individual com estreptomicina via i.m. 2 vezes por dia.
  • No mês de Outubro, considerado um período muito crítico devido à possibilidade de aparecimento de micotoxinas nos cereais armazenados em Itália, todas as porcas foram tratadas com um produto para desactivar micotoxinas. O tratamento prolongou-se durante 2 meses.
  • Durante o mês de Novembro todas as porcas foram tratadas novamente e durante 10 dias com clortetraciclina.

Após estes tratamentos os abortos diminuiram mas não desapareceram completamente.

No mês de Abril todas as porcas foram vacinadas com vacina viva contra o vírus do PRRS. Foram revacinadas na sala de partos e aos 50 dias de gestação, contudo, durante o mês de Julho, decidiu-se não se vacinar mais as porcas contra o PRRS.

As análises das amostras de sangue procedentes das porcas abortadas (n=4) foram as seguintes: 1 porcda PCR positiva para PRRS , títulos elevados para leptospirose em 2 porcas e 2 porcas positivas para GE-Aujeszky.

Visita à Exploração



Iniciou-se a recolha dos seguintes dados:

  • Estudo dos abortos
  • Estudo dos dados reprodutivos da exploração.
  • Perfil serológico das porcas abortadas, primíparas e gestantes para Aujeszky, Leptospirose, PRRS, Influenza (40 amostras).
  • Análise de urina (pH, sangue, proteínas) de porcas de 30 dias de gestação.
  • Observação das instalações das porcas.


Resultados





Observa-se que os abortos se dão sobretudo nas primíparas e nas porcas velhas e durante os meses de Outubro a Dezembro de 2002. A seguir mostram-se os resultados das análises:



Os perfis serológicos foram os seguintes:

PRRS
H1N1
H3N2
GE
L. bratislava/australis
L. pomona
Primíparas 30-40 días gestação (n=10)
*****
1/1280
1/1280
+
*****
1/1280
1/1280
+
******
1/320
1/320
+
1/1600
***
1/320
1/320
+
1/400
*******
1/160
1/320
-
***
1/320
1/1280
+
*********
1/160
1/1280
+
****
1/40
1/160
+
*
1/80
1/320
+
********
1/80
1/320
-
1/200
Primíparas 75 dias gestação (n=5)
***
1/320
1/1280
+
1/200
*****
1/320
1/1280
+
1/200
*****
1/160
1/640
+
***
1/320
1/1280
+
1/200
******
1/160
1/640
+
1/1600
Multíparas (n=19)
*******
1/320
1/1280
-
1/100
**
1/640
1/640
-
1/800
****
1/320
1/1280
-
*******
1/320
1/640
-
********
1/160
1/640
-
1/100
*****
1/1280
1/1280
-
NEG
1/1280
1/1280
-
******
1/640
1/1280
-
1/100
********
1/1280
1/1280
-
****
1/1280
1/1280
-
**
1/40
1/160
-
1/400
******
1/640
1/640
-
1/100
*****
1/1280
1/1280
-
***
1/320
1/1280
-
***
1/320
1/320
-
******
1/1280
1/1280
-
****
1/1280
1/1280
-
******
1/1280
1/1280
-
******
1/1280
1/1280
-
Porcas abortivas (n=6)
***
1/1280
1/1280
-
1/400
1/200
*******
1/1280
1/1280
-
1/200
1/100
****
1/1280
1/640
-
1/400
1/3200
****
1/320
1/1280
-
1/3200
****
1/1280
1/1280
-
1/100
******
1/1280
1/1280
-
1/200


Segundo estes resultados, para o PRRS a população de porcas está muito protegida, não se verificam porcas seronegativas, coisa que indica uma baixa probabilidade de circulação viral. No que diz respeito à Influenza, os títulos mostram que as porcas estão protegidas e que também estão vacinadas. Com relação à Aujeszky, observa-se circulação do vírus nas primíparas enquanto que as porcas velhas são todas negativas. Para a leptospirose observam-se algumas porcas com títulos muito altos que indicam infecção, sobretudo nas porcas que abortaram.

Diagnóstico



Antes de obter os resultados, suspeitava-se que os abortos fossem causados principalmente pelo PRRSV, sem excluír, contudo, uma infecção por leptospiras. Os resultados das análises mostram claramente uma disfunção renal (proteinuria, pH) associada à presença de mumificados, elevados títulos serológicos nas porcas abortadas, abortos tardios e precoces que afectam a primíparas e velhas. A maior frequência de abortos nos parques com solo sem grelha deve-se provávelmente a uma maior facilidade de difusão do microorganismo.



Medidas tomadas



A partir do mês de Dezembro levou-se a cabo o seguinte programa de tratamento e análises:

  • Oxitetraciclina: 1000 ppm durante 3 meses a todas as porcas e varrascos.
  • Injectar todas as porcas com penicilina-estreptomicina no momento do desmame assim como a todos os varrascos.
  • Após 3 meses de tratamento na ração, interrompe-se durante 15 dias e se retoma de novo durante mais 15 dias.
  • No outono de 2003 se iniciará de novo o tratamento com oxitetraciclina durante 3 meses.
  • Realização de análises de sangue dos eventuais abortos para Aujeszky, leptospirose, PRRS.
  • PCR para leptospirose nas amostras de sémen de todos os varrascos.


Evolução



O diagnóstico é ainda mais claro quando se observa a diminuição de abortos durante e depois do tratamento de 3 meses iniciado a 7 de Dezembro de 2002 como demonstra o gráfico:



Devemos ter presente que nem todos os abortos foram causados por leptospira, ainda que se possa assegurar que a leptospirose é uma doença importante nesta exploração.

Comentários


No início o caso parecia um episódio cíclico de abortos causados pelo PRRSV, dado que a exploração era positiva e que periodicamente se repetiam os casos clínicos reprodutivos, sobretudo nas primíparas. A exploração contava com uma quarentena, contudo, as porcas não se adaptavam ao PRRS e só se tentava evitar a introdução de novas doenças a partir das primíparas entradas na exploração.

As micotoxinas também supunham uma preocupação já que na Itália, o período 2002 - 2003 foi muito negativo no que diz respeito às contaminações de milho e trigo sobretudo com fumosina e zearalenona.

Após a primeira visita a primeira atitude que se tomou foi a de analisar as porcas abortadas. Enquanto se esperavam os resultados decidiu-se tratar todos os reprodutores com um produto para desactivar as micotoxinas pelo menos durante 2 meses.

Os primeiros resultados das análises evidenciaram a presença do vírus do PRRS, ainda que em algumas porcas também se tivesse observado títulos para Leptospira pomona . Pensou-se que ambas as doenças estavam a causar os abortos. Análises mais detalhadas de sangue e urina de um número significativo de porcas confirmou o diagnóstico de leptospirose. A presença de abortos durante o tratamento com antimicotoxinas enquanto se esperavam os resultados das análises despistaram as micotoxinas como causadoras dos abortos.

A presença de proteínas no sangue e urina em muitas das porcas (indicando claramente uma disfunção renal ) junto com a presença de títulos elevados para leptospirose no soro e as análises gráficas e de censo das porcas com abortos confirmaram que os abortos eram causados por Leptospira pomona.

Analisando também a estrutura da exploração, observou-se que as porcas que abortavam eram principalmente as porcas que se encontravam alojadas em parques com solo sem grelhas, onde é muito fácil a transmissão das espiroquetas e se favorece a permanência das leptospiras na exploração. As porcas alojadas em parques com solo em grelha tiveram menos abortos.

No mês de Janeiro, quase no final do segundo mês de tratamento, repetiram-se novos casos de abortos, inclusive em porcas tratadas. Realizaram-se novas análises e, uma vez mais, com base na análise do censo das porcas abortivas verificou-se que só as porcas de primeiro parto eram as afectadas. As análises de sangue das porcas abortadas e dos fetos mostraram a presença do vírus do PRRS e, pelo contrário, não se encontraram títulos para leptospiras.

Neste segundo episódio de abortos, os proprietários pensaram num primeiro momento que se devia novamente às leptospiras. Contudo, neste caso, o causador dos abortos foi o vírus do PRRS.

Por causa dos abortos ocorridos, nos meses de verão na exploração faltaram porcos de engorda e as instalações estavam vazias, de forma que no mês de Dezembro se comprou um lote de leitões de 30 kg que foram engordados num parque próximo ao das primíparas. Foram estes leitões os que introduziram uma variante de virus do PRRS desconhecida na exploração, provocando um episódio de abortos nas primíparas. Este episódio durou cerca de 2 meses e na actualidade a exploração é estável para PRRS.

Na actualidade o controle da leptospiroses continua a realizar-se com 2 tratamentos anuais de 2 meses de duração com oxitetraciclina em todos os reprodutores. Espera-se chegar a um controle eficaz da doença. Iniciou-se também um programa de adaptação das primíparas em quarentena para as doenças presentes na exploração.

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